O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, entregou ao Congresso uma proposta de orçamento de US$ 3,6 trilhões em que espera "romper com o passado problemático", com uma mudança rumo a um maior ativismo do governo, elevação de impostos sobre famílias muito ricas e empresas e cortes de gastos.
A proposta de orçamento é uma das receitas políticas mais ambiciosas em muitas décadas, uma reorganização do governo federal para oferecer cuidados com saúde nacionalmente, mudar a política de energia para longe de petróleo e gás, e impulsionar o compromisso federal com a educação.
Para financiar tudo, as famílias que ganham mais de US$ 250 mil e uma variedade de empresas pagariam um preço elevado, mas Obama pediu que os norte-americanos admitam os erros do passado e aceitem sacrifícios profundos. "Haverá escolhas difíceis no caminho", afirmou Obama. O presidente colocou a culpa dos problemas econômicos do país no governo que o precedeu e em uma nação que se perdeu.
Seu plano orçamentário projeta um déficit federal de US$ 1,75 trilhão para 2009, ou 12,3% do Produto Interno Bruto (PIB), um nível não visto desde 1942, quando os EUA entravam na Segunda Guerra Mundial. "Essa crise não é nem o resultado de uma mudança normal no ciclo econômico, nem um acidente da história", afirmou o presidente na mensagem de abertura do documento de 134 páginas.
DESABAFO. "Chegamos a esse ponto como resultado de uma era de profunda irresponsabilidade que engoliu instituições públicas e privadas, desde alguns dos executivos das maiores empresas até posições de poder em Washington."
Até 2013, o déficit poderá cair para US$ 533 bilhões, mas voltará a subir já que os que nasceram no pós-Guerra (fase chamada de baby boom) começarão a pedir benefícios de aposentadoria e saúde. O orçamento separa mais US$ 250 bilhões para completar os esforços do presidente de resgatar os mercados financeiros e estabilizar o setor bancário. Isso viria além dos US$ 700 bilhões já alocados pelo Congresso.
O orçamento deixa claro que esses US$ 250 bilhões seriam usados para ajudar na compra de US$ 750 bilhões em ativos podres que pesam no balanço dos bancos. Obama propõe amplo aumento no financiamento para educação, incluindo indexar o subsídio para ensino superior (programa Pell Grant) à inflação e converter a bolsa de estudos popular para um programa automático de "direito".
Ferrovias para trens de alta velocidade ganhariam uma ajuda de US$ 1 bilhão por ano, como parte de um esforço maior para impulsionar os gastos com infraestrutura, além dos recursos do plano de estímulo de US$ 787 bilhões. O Departamento de Defesa receberia um impulso de US$ 20,4 bilhões em 2010, um aumento de 4% em relação a este ano. Obama pedirá mais US$ 75,5 bilhões para as guerras no Iraque e Afeganistão para o restante de 2009 e outros US$ 130 bilhões para 2010, uma vez que ele pretende retirar a maioria das tropas de combate do Iraque nos próximos 19 meses, mas enviar muitos dos soldados para o Afeganistão.
EMISSÕES DE GASES. Em uma das mais ambiciosas propostas, o presidente pretende reduzir as emissões de gases que causam o efeito estufa, forçando os poluidores a comprar permissões para as emissões, que serão reduzidas gradualmente para 14% abaixo dos níveis de 2005 até 2020 e 83% abaixo dos níveis de 2005 até 2050. A venda de tais permissões, a partir de 2012, irá atingir US$ 646 bilhões até 2019. De tais receitas, US$ 525,7 bilhões serão direcionados para a ampliação da provisão de crédito tributário de US$ 800 para casais que trabalham, chamado Making Work Pay. Outros US$ 120 bilhões irão para tecnologia de energia limpa.
Obama revelou que o fundo de US$ 630 bilhões para o programa de seguro de saúde não será suficiente para garantir acesso de todos os norte-americanos à saúde, mas afirmou que será um início. Para financiar suas propostas, o presidente claramente elegeu os vencedores e os perdedores - com uma afluente lista encabeçada por perdedores.
Em tons populistas que refletem o descontentamento que notadamente evitou durante sua campanha, Obama escreveu que "investimentos prudentes na educação, em energia limpa, na saúde e infraestrutura foram sacrificados em nome de profundos cortes nos impostos para os mais ricos e bem relacionados.
Tendo em vista estas barganhas, Washington ignorou o sacrifício das famílias de classe média, tornando ainda mais difícil a situação para elas. Não há nada de errado em ganhar dinheiro, mas há algo errado quando permitimos que o campo de jogo se amplie em favor de tão poucos". Nesse sentido, o orçamento se autofinancia.
Como previsto, haverá aumento de impostos para pessoas físicas com renda de US$ 200 mil e casais com renda de US$ 250 mil, a partir de 2011, para que se chegue ao total de US$ 656 bilhões nos próximos 10 anos. O aumento no Imposto de Renda irá, sozinho, levantar US$ 339 bilhões. Limites para isenção e deduções de imposto das pessoas físicas renderão outros US$ 180 bilhões.
As taxas para ganhos de capital mais elevados trarão US$ 118 bilhões. Os impostos sobre espólios, que estavam previstos para serem suspensos no ano que vem, serão, ao contrário, preservados para sempre, com os espólios acima de US$ 3,5 milhões - de US$ 7 milhões para casais - taxados em 45%.
As empresas serão atingidas também. O orçamento prevê obtenção de US$ 210 bilhões nos próximos 10 anos ao limitar a capacidade das companhias multinacionais norte-americanas de evitar a taxação de lucros obtidos no exterior. Outros US$ 24 bilhões virão dos fundos de hedge e dos administradores de private equity, cujo lucro será taxado como Imposto de Renda e não como ganho de capital. As companhias de petróleo e gás serão particularmente mais afetadas, com a revogação de vários créditos tributários e deduções. O governo federal assumiria boa parte dos empréstimos estudantis.
SAÚDE E AGRICULTURA. Seguradoras privadas sofrerão reduções nos pagamentos recebidos por meio do programa de saúde Medicare. Agricultores com renda operacional superior a US$ 500 mil teriam seus subsídios interrompidos, e o armazenamento de algodão não seria mais financiado pelo governo federal. "Há momentos em que você consegue arcar com as despesas de redecorar sua casa, e há momentos em que você precisa se concentrar na reconstrução da fundação", avaliou. "Hoje o nosso foco é a fundação."
Para todo 2010, o projeto prevê gastos totais de US$ 3,606 trilhões, contra US$ 3,724 trilhões do exercício anterior. O déficit este ano equivalerá a 12,3% do PIB e, no exercício de 2010, a 8%. O orçamento também prevê uma contração de 1,2%% do PIB este ano e um crescimento de 3,2% em 2010. A Casa Branca, por outro lado, espera três anos de crescimento muito forte: 4% em 2011, 4,6% em 2012 e 4,2% em 2013.
O governo recordou que o comitê de Orçamento do Congresso, em suas projeções de janeiro, não levou em conta o plano de reativação econômica votado em 13 de fevereiro. Este apresentava projeções menos otimistas, com -2,2% em 2009 e +1,5% em 2010. O orçamento também fala de uma taxa de desemprego de 8,1% este ano e de 7,9% em 2010. Em janeiro, a taxa foi de 7,6%, segundo as cifras do departamento do Trabalho.
Segundo a Nielsen Media Research, mais de 52 milhões pessoas assistiram nos Estados Unidos ao discurso de Barack Obama ao Congresso na noite de terça-feira, no qual ele pregou a necessidade de sacrifícios para recuperar a economia americana. A cifra corresponde a 49% daqueles que viam TV no momento da fala. Os espectadores superam os 49,5 milhões que acompanharam a primeira entrevista coletiva de Obama como presidente, no dia 9, e estão bem acima dos 39,8 milhões que assistiram ao primeiro discurso de George W. Bush ao Congresso, em 2001. O número de espectadores pode ser ainda maior, já que a conta não inclui quem viu o discurso pela internet.
PETROLÍFERAS. O governo americano também propôs nesta quinta-feira levantar pelo menos US$ 31,5 bilhões durante os próximos dez anos das companhias de petróleo e gás, um reflexo do cancelamento de benefícios fiscais para a produção doméstica e de novos encargos sobre a produção de petróleo e gás no Golfo do México.
Os planos, que fazem parte da proposta de orçamento para o ano fiscal de 2010, que começa em outubro, retomam esforços antigos dos democratas para transformar o setor de petróleo e gás em fonte de financiamento para outras prioridades. As petroleiras têm tentado manter o tratamento fiscal favorável, que segundo elas conserva empregos nos EUA ao estimular a produção doméstica. O Congresso já reduziu a dedução no ano passado para fazer frente a benefícios fiscais para a energia solar e eólica, mas não chegou a eliminá-la inteiramente.
"Com a América no meio de uma recessão econômica, agora não é o momento de criar novos impostos para o setor de petróleo e gás", disse o presidente do Instituto Americano de Petróleo, Jack Girard, em comunicado. "Novos impostos podem significar menos empregos nos EUA e menos receita num tempo em que precisamos desesperadamente de ambos". O governo de Obama também propôs um novo imposto sobre a produção de petróleo e gás no Golfo do México, afirmando que ele irá levantar cerca de US$ 5 bilhões nos próximos dez anos.
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