Alex Ribeiro, de Brasília
A conta corrente do balanço de pagamentos está sofrendo uma virada mais rápida e intensa do que a prevista pelo Banco Central. Segundo dados divulgados ontem, o saldo negativo somou US$ 10,757 bilhões no primeiro trimestre, chegando muito próximo dos US$ 12 bilhões esperados pela autoridade monetária para 2008. Para abril, a expectativa do BC é um novo resultado negativo, de US$ 2,8 bilhões, o que elevaria o déficit acumulado no ano para US$ 13,557 bilhões.
O saldo em conta corrente é um dos principais indicadores da sustentabilidade externa da economia. Nele, são incluídas as operações de comércio exterior (importações e exportações), os serviços (turismo internacional, transportes, aluguel de equipamentos, entre outros), as rendas (pagamentos de juros da dívida e remessas de lucros e dividendos) e as transferências unilaterais (sobretudo dólares remetidos ao país por brasileiros que vivem no exterior). Quando um país tem déficits em conta corrente, é obrigado a tomar empréstimos ou atrair investimentos estrangeiros para cobrir a diferença.
Entre 2003 e 2007, o Brasil registrou superávits em conta corrente, que permitiram ao país pagar parcela de sua dívida externa e acumular reservas. O BC já esperava que a partir de 2008 a economia voltasse a apresentar déficits em conta corrente, em virtude da valorização do real e do crescimento do consumo, dos investimentos e dos gastos do governo, que puxam as importações de bens e serviços e reduzem o excedente exportado pelo país. Na visão do BC, déficit de US$ 12 bilhões, que equivale a 0,86% do PIB, seria facilmente financiado, sem fragilizar os indicadores de solvência externa.
Entre o primeiro trimestre de 2007 e de 2008, as contas correntes sofreram virada de US$ 10,998 bilhões, passando de um superávit de US$ 241 milhões para um déficit de US$ 10,757 bilhões. A balança comercial explica 53% dessa virada. O saldo caiu US$ 5,885 bilhões, saindo de US$ 8,720 bilhões no primeiro trimestre de 2007 para US$ 2,835 bilhões em período correspondente de 2008. "A balança comercial viveu um período atípico neste início de ano, por isso temos que aguardar um pouco mais para ver o que nesses números é passageiro e o que é uma tendência mais permanente", disse o chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes. Ele lembrou que a Receita Federal entrou em greve em março, prejudicando exportações e importações; ocorreram atrasos nos embarques de soja; e houve interrupção no transporte de minério em uma das ferrovias da Vale do Rio Doce. A projeção oficial do BC é de superávit comercial de US$ 27 bilhões neste ano, abaixo dos US$ 40,028 bilhões em 2007. Os analistas econômicos privados projetam um superávit comercial de US$ 25 bilhões em 2008, segundo pesquisa do BC de expectativas do mercado.
As remessas de lucros e dividendos respondem por 43% da virada no resultado em conta corrente entre o primeiro trimestre de 2007 e de 2008. De um período para o outro, as remessas de lucros e dividendos subiram US$ 4,697 bilhões, passando de US$ 3,965 bilhões para US$ 8,662 bilhões. As estatísticas parciais de abril, que cobrem até o dia 28, registram a remessa líquida de US$ 3,3 bilhões.
Lopes disse que o aumento das remessas de lucros e dividendos é causado por quatro fatores: 1) os fortes investimentos diretos e em Bolsa, que aumentam o volume de capitais estrangeiros aplicados no país; 2) a valorização do real, que aumenta os lucros, quando convertidos em dólares; 3) o bom desempenho da economia, que aumenta o lucro das empresas; 4) a crise internacional, que leva algumas empresas a remeter resultados ao exterior para cobrir prejuízos registrados em outros países.
Para Lopes, é positivo que o déficit em conta corrente seja puxado por remessas de lucros e dividendos, e não por pagamentos de juros da dívida externa, como ocorria até 2002. "As empresas só remetem lucros e dividendos quando a economia vai bem e os resultados são favoráveis", afirma Lopes. Já o pagamento de juros, afirmou, é um compromisso fixo, que deve ser honrado mesmo quando a economia vai mal. "As crises do balanço de pagamento no Brasil sempre envolveram o pagamento de juros e principal de dívida." Para ele, as fortes remessas não podem ser interpretadas como um sinal de desinvestimento na economia. "Alguns dos setores que mais remetem lucros e dividendos também estão entre os setores que mais investem dentro do país", afirmou.
O setor de serviços financeiros foi responsável por cerca de 33,5% das remessas no primeiro trimestre, com US$ 2,228 bilhões. Os investimentos diretos do setor somaram US$ 1,463 bilhão no mesmo período. A indústria automobilística respondeu por 17,7% das remessas, com US$ 1,176 bilhão, e os investimentos diretos desse setor somaram US$ 718 milhões.
O turismo internacional respondeu por 6% da virada das contas entre o primeiro trimestre de 2007 e de 2008. O déficit em turismo aumentou US$ 668 milhões, de US$ 262 milhões para US$ 930 milhões no período. Os brasileiros estão viajando mais e gastando mais no exterior. O dado positivo é que o Brasil continua a atrair turistas. Os gastos de estrangeiros no Brasil aumentaram 21% no mesmo período, para US$ 1,608 bilhão.
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