Marcelo Pereira
Durante os últimos três anos, vivenciamos no mercado brasileiro um "boom" incrível nos preços dos ativos e nas rentabilidades de vários produtos financeiros, entre eles, os fundos de investimento. Segundo dados da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid), o setor de fundos brasileiro já acumula patrimônio de R$ 1,2 trilhão. Só para se ter idéia, no início de 2000, o patrimônio era de R$ 297 bilhões, ou seja, um crescimento de quatro vezes.
Inúmeros foram as aberturas de capital (IPO, na sigla em inglês) que encantaram a todos, com rentabilidades infladas a cada novo lançamento pelo impulso dos amigos que ganharam a rentabilidade de um ano inteiro em uma hora. Vale lembrar que houve casos, como o da Bovespa Holding, em que o papel subiu 50% no primeiro dia de negociação na bolsa.
Muitos foram os recordes de captação de fundos multimercados e de renda variável inflados a cada mês pela rentabilidade do semestre anterior ou mesmo do mês anterior. Algumas vezes, até aplicações com objetivos conservadores, vivenciando a euforia do mercado, apresentaram resultados polpudos, mas fora do escopo e do histórico do produto. Não que o gestor estivesse fugindo do mandato estabelecido pelo fundo, mas certamente assumindo um risco muitas vezes excessivo em busca de um retorno fácil e rápido.
Os produtos financeiros procurados pelos investidores passaram a ser escolhidos pelo seguinte critério: "o fundo que rendeu mais no último mês ou qual o IPO que será mais rentável em menos tempo". Este processo, que chamo de "ilusão rentabilística", normalmente acontece em períodos de crescimento ininterrupto e de baixa volatilidade. Essa ilusão acaba deturpando a percepção de risco dos investidores e criando também um referencial de mercado ilusório. Isso inevitavelmente aumentará a exposição a risco do investidor trazendo surpresas desagradáveis no médio prazo.
Mas chegamos a agosto de 2007, mês que carrega a responsabilidade de três anos de histórico baseado nesse cenário. Eis que, então, a volatilidade apareceu! E, desta vez, para todos os lados. Nos primeiros meses de turbulência, muitos investidores em vez de diminuírem suas exposições ao risco - ou simplesmente não aumentarem o risco e diminuírem sua liquidez -, aumentaram suas posições, acreditando que este seria mais um pequeno "soluço" do mercado. Afinal, naquele momento, o mercado caiu tanto que muitos ativos tinham perdido substancialmente seu valor. A maioria acreditava que o mercado iria voltar.
Mas a verdade é que não voltou nem em agosto, nem em 2007 e provavelmente nem em 2008. As provisões para as perdas foram aumentando a cada toque do sino. A volatilidade aumentou em todos os mercados. Até mesmos as commodities, que haviam passados incólumes pelo início da crise, passaram a acompanhar o vai-e-vem do mercado.
Chegamos aos dias atuais. A "porta" (agora de saída das aplicações) diminuiu substancialmente. Os investidores passaram a perguntar o porquê de resultados tão ruins, o motivo para a valorização deste ou daquele ativo. Relembro: em muitos casos, os ativos hoje valem o que deveriam valer. Antes é que estavam supervalorizados. Os saques nos fundos multimercados se multiplicaram, já que muitos não repetiram os resultados padrão de meses atrás. Vale lembrar que esses fundos são aqueles mesmos que eram, até então, considerados excepcionais. A maioria dos gestores continua fazendo o que fez nos últimos três anos.
Na verdade o investidor ainda não tem visão de longo prazo. E julgo que a culpa vem da junção de três costumes brasileiros. O primeiro é o CDI exorbitante, já que os investidores se acostumaram a ganhar 30% ao ano sem volatilidade as custas do financiamento da dívida do governo. O segundo vem da famosa cota diária que inevitavelmente trouxe e traz mais ansiedade e sensação de volatilidade para os investidores. O terceiro é o que chama de "ilusão rentabilística", depois de o investidor ter vivido momentos contínuos de baixa volatilidade e ganhos significativos. A paciência do investidor ainda é curta e pouco analítica sobre o que realmente se espera de um investimento ou quais os níveis de risco que são aceitáveis. Estes investidores, que hoje vivem quase uma crise existencial, vão ter de necessariamente aceitar momentos de turbulência e de oscilações econômicas se quiserem alcançar maiores retornos em suas carteiras.
Esta visão em relação ao tempo de investimento já foi menor em outras épocas. E cada vez mais é uma questão de aculturamento de questões como segurança nas escolhas dos produtos, entendimento dos riscos e do prazo de maturação do investimento. E isto, não tem jeito, é uma questão de longo prazo.
Marcelo Pereira é sócio da TAG Investimentos
E-mail: marcelo.pereira@taginvest.com.br
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