LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
SUPERADA a polêmica sobre a natureza da inflação que vivemos hoje -ela não está associada apenas ao aumento do feijão, mas ao superaquecimento do consumo-, podemos tratar agora de como combatê-la de forma mais eficiente. A terapia para lidar com uma dinâmica de aumento de preços criada por um descompasso temporal entre demanda e oferta é muito simples: reduzir a absorção interna da economia pelo aumento dos juros e da poupança do setor público.
Outros instrumentos -como a valorização do câmbio- precisam ser analisados caso a caso, em razão da condição particular de cada economia. Em algumas situações, podem funcionar como complementos eficientes à política monetária; em outras, apenas mascaram por algum tempo os índices de preços, criando problemas adicionais ao controle da inflação no médio prazo.
No caso brasileiro, o fortalecimento do real vai contribuir para um aumento do consumo, via o canal de poder de compra dos salários em dólares, em um momento de grande excitação das importações. E seu efeito sobre as exportações, dada a nossa pauta atual de comércio exterior, seria pouco eficiente como mecanismo de redução da absorção interna. O efeito líquido de um real mais forte, apesar do impacto nominal na inflação, pode ser negativo no controle da demanda, já que deriva de um choque positivo em nossos termos de troca externos.
O governo fez um movimento correto ao aumentar o superávit primário em 0,5%. Embora modesto -e certamente insuficiente-, ele mostra um melhor entendimento da dinâmica que teremos que enfrentar nos próximos trimestres. Mas é sobre o Banco Central que recairá a maior responsabilidade para promover uma redução próxima a 2,5% na absorção interna ao longo dos próximos 12 ou 18 meses. Isso corresponde trazer o crescimento do PIB para algo próximo a 3,5% ao ano ao longo de 2009.
Simulações realizadas na Quest mostram que, para atingir esse objetivo, um aumento da ordem de três pontos percentuais na taxa Selic será necessário. Isso significa que, na velocidade atual definida pelo Copom de 0,5 ponto por reunião, o movimento de aumento dos juros estará encerrado na última reunião deste ano. Mas a incerteza ao redor dessa trajetória é alta e o risco é que seja necessário um aumento maior nos juros.
A batalha atual para reduzir o ritmo do consumo doméstico manterá os juros altos durante boa parte de 2009. Isso porque, em comparação ao ciclo de juros de 2004 e 2005, a situação atual tem característica distinta. A principal delas está na dinâmica do mercado de trabalho e do sistema bancário. A sustentação do ritmo do consumo é hoje muito maior em razão do crescimento da massa salarial e da oferta e do alongamento dos prazos do crédito bancário aos indivíduos. Não temos no passado recente uma combinação de estímulos à atividade econômica tão sólidos como a existente hoje.
Por outro lado, o ciclo de investimentos é muito forte e disseminado, o que dá certo conforto de que não será necessário provocar uma parada total do crescimento. Faço duas observações finais. Em primeiro lugar, as medidas da inflação nos próximos meses darão a falsa impressão de uma baixa eficiência nas ações do BC. A segunda é que um pouso suave da economia ao longo de 2009 terá um enorme impacto sobre a avaliação dos mercados na medida em que, pela primeira vez em décadas, a inflação seria controlada sem um colapso da economia.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS , 64, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
lcmb2@terra.com.br
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