Alex Ribeiro
As projeções de inflação do Banco Central não apenas pioraram desde março, superando o centro das metas de 2008 e de 2009, como cresceram os riscos de os preços subirem além do esperado, mostra o relatório de inflação de junho, divulgado ontem. "O BC vai fazer o que for necessário, enquanto for necessário, para trazer a inflação para a trajetória das metas", disse o diretor de política econômica da instituição, Mário Mesquita.
Ele sinalizou que o ciclo de aperto monetário poderá ser longo. "Acredito que o BC atuou quando foi cabível e continuará a agir enquanto for cabível", disse. "Isso significa, como falou o presidente [do BC, Henrique] Meirelles, na semana passada, um período razoável de tempo."
O BC projeta em seu cenário de referência uma inflação de 6% neste ano, acima do centro da meta, de 4,5%, tomando como base juros básicos nos atuais 12,25% ao ano e taxa de câmbio em R$ 1,65. Houve considerável piora na projeção do BC em relação aos 4,6% previstos no relatório de março. Para 2009, a projeção é uma inflação de 4,7%, acima do centro da meta (4,5%) e dos 4,4% projetados em março. Segundo o relatório, as projeções pioraram porque índices de preços divulgados recentemente superaram o previsto e porque as expectativas de inflação do mercado financeiro subiram.
Apesar da alta, a evolução da inflação vislumbrada pelo BC para os próximos dois anos é, de certa forma, benigna. A variação do índice de preços, que acumula 5,58% nos 12 meses encerrados em maio, deverá subir a 5,9% em período correspondente encerrado em junho e chegar à máxima de 6,3% em setembro. Daí em diante, começa a desacelerar, fechando o ano de 2008 em 6%, caindo para 5,7% em março de 2009 e para 4,8% em junho de 2009. Se estabilizaria em 4,7% entre setembro de 2009 e março de 2010. Em junho de 2010, subiria um pouco, para 4,8%.
Mesquita explica que dois fatores irão contribuir para baixar a inflação a partir do quarto trimestre. Um deles é que o aperto monetário feito até agora irá chegar á inflação. O outro, é estatístico: como a inflação no fim de 2007 foi mais alta, a variação relativa de preços no segundo semestre de 2008 tende a ser menor, porque ela ocorrerá partir de uma base maior.
Apesar da evolução mais favorável prevista para 2009, existe um risco de 25% de a inflação superar o teto da meta, de 6,5%, em 2008. Esse risco é bem maior do que o de 4% registrado no relatório de março. Mesquita argumenta, porém, que essa não é a primeira vez que o risco de estouro da meta é tão alto. Entre fins de 2004 e início de 2005, ele também rondou 25%. Mas, disse, a política monetária restritiva de então reduziu esse risco a meros 4% em meados de 2005.
O diretor do BC explicou que é esperada uma ligeira aceleração da inflação no segundo trimestre de 2010 porque, até lá, vão se esgotar os efeitos da política monetária colocada em prática neste momento. Mas a alta nas projeções de inflação de 2010, ponderou, não autorizam a conclusão de que a política monetária não sofrerá distensão até o fim do governo Lula. "Não necessariamente [os juros] vão ficar congelados ao longo do tempo, mesmo porque a política monetária está atuando, e os cenários inflacionários respondem a ela", afirmou.
O relatório de inflação alerta que cresceram os riscos de a inflação não se comportar exatamente como o previsto nas projeções. Um termômetro do grau de incerteza é o número de vezes que a palavra "risco" aparece no capítulo do relatório em que o BC apresenta suas projeções inflacionárias - são 47 vezes, ante 32 vezes em março. Em junho do ano passado, quando o BC ainda cortava os juros básicos, a palavra "risco" apareceu 14 vezes.
O principal risco descrito pelo BC é o crescimento do consumo, investimentos e gastos do governo acima do que a capacidade da economia pode atender. "A robustez da demanda doméstica tem exercido pressão sobre a capacidade de oferta de praticamente todos os setores da economia", diz o relatório.
O BC diz que, desde março, agravou-se o risco de aumentos de preços do atacado contaminarem os preços de varejo. "O risco maior advém dos preços industriais pois, além de se localizarem mais próximos da etapa final do consumo final e, por conseguinte, transmitirem-se mais rapidamente para os preços aos consumidor, costumam mostrar mais persistência."
Outro fator de risco que aumentou é os reajustes salariais superarem o avanço da produtividade da economia. "O crescimento da inflação dos últimos meses tornou-se importante fator de contenção dos ganhos reais do rendimento do trabalho e pode ensejar pressão sobre rendimentos nominais, retro-alimentando a inflação."
O BC cita ainda a deterioração das expectativas de inflação do mercado financeiro para 2009 e 2010 como outro fator de risco que se agravou. "Esse comportamento é indicativo importante de que os fatores subjacentes à aceleração recente da inflação podem ter um caráter mais persistente do que se antecipava."
Os riscos externos também pioraram, diz o BC, embora continuem menos importantes que os domésticos. A desaceleração dos Estados Unidos está sendo mais forte do que a prevista em março, e há sinais de que a inflação global está se intensificando.
Mesquita iniciou a apresentação do relatório logo após a divulgação de uma alta de 0,90% no IPCA-15. Questionado se o BC já previa a recente aceleração inflacionária, ele disse que a autoridade monetária "atua sempre com as informações disponíveis no momento da tomada das decisões". "Certamente, na reunião (do Copom) de julho, vamos utilizar um conjunto de informações ampliado, atualizando esses últimos dados", disse.
Ele rebateu críticas de alguns analistas econômicos que dizem que o BC tem sido frouxo na condução da política monetária. "O BC sinalizou em março sua preocupação com a inflação e alguns desses mesmos analistas criticaram a nossa preocupação, dizendo que era terrorista", disse. Segundo ele, o BC não espera que as decisões de política monetária tenham efeito instantâneo na inflação, porque parte dos mecanismos de transmissão tem defasagens consideráveis. No relatório, o BC divulgou um "box" em que mostra que, assim como no passado recente, a política monetária tem sido eficaz para adequar o crescimento da economia à capacidade produtiva.
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