Com a decisão do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), na quarta-feira, de manter a taxa de juros em 2% ao ano, mostrando que ainda está preocupado com a fraqueza da economia dos EUA, o mercado tinha todos os motivos para respirar aliviado e subir com algum vigor. Foi exatamente o contrário que aconteceu. A manutenção dos juros nos EUA virou pão amanhecido com tantas desgraças mais quentes que vieram de terras estrangeiras. A revisão do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) americano no primeiro trimestre, de 0,9% para 1%, também soou como notícia velha e os investidores deram de ombros para ela.
O Índice Bovespa chegou a zerar os ganhos do ano durante o pregão, mas recuperou um pouco no fim dos negócios, encerrando o pregão com mísera alta de 0,09% ao ano, ou seja, um nada. No dia, o índice caiu 2,89% fechando aos 63.946 pontos. Essa é a menor pontuação desde 29 de abril - um dia antes de o Brasil ser promovido a grau de investimento - quando o índice fechou a 63.825 pontos. No mês, o indicador acumula uma baixa de 11,91%, acompanhando o caos que toma o mercado americano. Até agora, o Índice Dow Jones, da Bolsa de Nova York, perde 9,4% em junho. Já é o pior desempenho em um mês de junho desde a grande depressão da economia americana, em 1930, quando o Dow Jones despencou 18% em apenas um mês.
"Estamos vivendo dentro de um trem fantasma, todos os dias caem em nossas cabeças um ou mais esqueletos, que estão amedrontando os investidores", diz o gestor de renda variável da Infinity Asset Management, George Sanders. O pavor tem tomado conta especialmente do espírito dos estrangeiros. Este mês, até o dia 24, o saldo líquido (diferença entre compras e vendas) do capital externo na Bovespa está negativo em R$ 7,4 bilhões, um recorde incontestável.
Um dos principais esqueletos de ontem atende pelo nome de Citigroup. Rodaram o mundo as projeções de um analista do banco Goldman Sachs de que a instituição financeira americana terá uma baixa contábil de mais US$ 9 bilhões em seu balanço do segundo trimestre e, portanto, será obrigada a, novamente, encontrar um investidor bondoso disposto a fazer um aporte de capital.
O medo, que parecia enterrado, de que a crise do setor imobiliário americano puxe o pé dos grandes bancos internacionais mostrou que está mais vivo do que nunca. Esse temor tem levado o mercado inteiro para a cova, mas as ações dos bancos brasileiros agonizam de forma especial. Erroneamente, na visão da grande maioria dos analistas, os investidores estrangeiros imaginam que, assim como muitos bancos internacionais, os brasileiros também possuem créditos imobiliários podres escondidos dentro do armário.
Esqueleto II - a missão
Outro esqueleto que caiu no colo do mercado ontem foi o petróleo. Este, no entanto, parece mais feio e em condições de fazer maiores estragos na economia mundial do que os problemas dos bancos internacionais. O primeiro contrato do barril de petróleo do tipo WTI, negociado em Nova York, com vencimento em agosto, fechou a US$ 139,64, recorde, com alta de 3,78%. O presidente da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), Chakib Khelil, afirmou que o petróleo deve alcançar a marca dos US$ 150 a US$ 170 ainda este ano. Essa é a típica profecia auto-realizável. Se a pessoa mais importante da entidade que reúne os maiores produtores de petróleo no mundo faz esse prognóstico, quem será o louco de questionar? O resultado é que, muito provavelmente, a commodity caminhará para esses níveis.
Não bastasse a escalada do petróleo provocar uma pressão inflacionária no mundo inteiro, a alta do produto tem tido uma correlação direta com a curva dos juros futuros no Brasil, lembra o gestor de fundos da Schroders Brasil, Marcos De Callis, citando um trabalho do analista da asset Francisco Vanzolini. "A cada alta do petróleo, as taxas futuras também sobem", diz De Callis. "Considerando que a bolsa, historicamente, caminha para o lado oposto dos juros, isso significa que as ações devem continuar caindo." Adicionalmente, a Bovespa deve sofrer mais do que outras bolsas de países emergentes, já que vários bancos internacionais importantes estão reduzindo a recomendação em ações brasileiras, que até então era de acima da média ("overweight"), consequência do aumento da taxa Selic, completa De Callis.
O mal-estar do mercado este mês está levando os mais otimistas a se resignarem de que a situação piorou. "Reconheço que errei, imaginava que, quando o Ibovespa caísse para 65 mil, 66 mil pontos, teria forças para buscar novamente os 69 mil pontos", diz Sanders, da Infinity Asset. "Agora, depois de tantas notícias negativas, não me surpreenderia se o índice fosse buscar a marca dos 62 mil pontos", completa o gestor.
Daniele Camba é repórter de Investimentos
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