Maria Cristina Pinotti e Affonso Celso Pastore
No meio da insegurança e do medo desencadeados pela atual crise internacional, há um conjunto de boas notícias. A eleição de Barack Obama nos Estados Unidos coloca no poder, no epicentro da crise, um líder que está formando uma equipe econômica competente e experiente, à altura dos desafios que terá de enfrentar. O Federal Reserve vem usando todos os caminhos possíveis para elevar a eficácia da política monetária, e há um espaço enorme para o uso da política fiscal, que certamente será utilizado pelo próximo presidente. A gravidade da crise tem feito brotar uma coordenação informal das políticas econômicas dos países afetados. Duas foram as contribuições do Reino Unido em "abrir caminhos". A primeira foi a proposta de enfrentamento da crise financeira feita pelo primeiro ministro Gordon Brown, que superou a proposta "ideológica" e ineficaz do secretário Paulson, e que acabou sendo rapidamente seguida pela maioria dos países, inaugurando uma nova fase na crise na qual instituições financeiras não quebram mais. A segunda: propor um pacote fiscal da ordem de 1% do PIB com o objetivo de estimular a deprimida economia britânica, que se somou à artilharia pesada do Banco da Inglaterra que vem reduzindo agressivamente a taxa de juros. A União Européia caminha na mesma direção. Lá a coordenação fiscal entre os vários países é mais difícil, mas é possível, e vem apresentando avanços, ao lado da queda contínua da taxa de juros. A forte desaceleração da economia chinesa, cuja taxa de crescimento do PIB segundo a OECD deverá cair para 7,5% em 2009, também levou o governo a propor um pacote fiscal de estímulo à economia, e o Banco da China há alguns dias derrubou a taxa de juros em 100 pontos base. Será que esta receita de estímulo fiscal e monetário abundante deveria ser seguida por todos os países? Estaria o Brasil se atrasando para corrigir sua rota?
Diante da forte desaceleração a que está sujeita, a China pode e deve usar vigorosamente a política fiscal, fundamentalmente porque não depende de ingressos de capitais para financiar suas contas correntes. Ao contrário, é um país com superávits nas contas correntes e, portanto, é um exportador de capitais. Se o governo elevar os gastos públicos, expandindo vigorosamente a absorção, estará apenas reduzindo o superávit nas contas correntes e exportando um pouco menos de capitais para o resto do mundo. São mudanças que não alteram sua taxa cambial, e cujo resultado inequívoco é a expansão da demanda e do crescimento do PIB. Os EUA têm déficits nas contas correntes, mas gozam do privilégio de ter o mundo disposto a financiar déficits crescentes. A Europa não tem a agilidade da China e dos EUA quanto à utilização da política fiscal. Ela é uma união monetária, com uma política monetária única, mas com políticas fiscais razoavelmente independentes entre os países. Mesmo assim há um esforço de coordenação, como o recentemente anunciado pelo atual presidente Barroso, que caminhará na mesma direção dos esforços de China, Reino Unido e Estados Unidos. As ações tomadas pelos EUA, Reino Unido, China e União Européia mostram o caminho para a superação da crise, mas não indicam que o final do processo está próximo. Há em marcha um processo contínuo de desalavancagem no sistema financeiro, que continua contraindo o crédito internacional e reduzindo os fluxos de capitais. E há uma recessão mundial, com a sua dinâmica própria que indica um processo longo de ajuste. Há uma luz no fim do túnel, mas o túnel é muito longo.
Se no Brasil o governo tentar elevar os gastos públicos para, em uma visão keynesiana estreita de ativar a economia, colherá a queda da formação bruta de capital fixo e a sua desaceleração. Por quê? Somos essencialmente diferentes da China. Primeiro, dependemos dos fluxos de capitais, que encolheram, e dos preços internacionais de commodities, que na recessão mundial declinam. Com isso caem as exportações e o câmbio real se deprecia, o que prejudica as importações, das quais a formação bruta de capital fixo é extremamente dependente. O aumento da absorção através do aumento dos gastos públicos eleva o déficit nas contas correntes, que não pode crescer devido à restrição dos fluxos de capitais, disparando uma depreciação cambial que encarece as importações e a formação bruta de capital fixo, reduzindo ambas.
O que o governo deveria fazer é limitar-se ao que vem fazendo até aqui. Cuidar do suprimento de linhas de exportação e da normalização do crédito bancário, mas tentando evitar navegar contra a maré. A curto prazo, uma desaceleração do crescimento é inevitável. Se ela for aceita, o Brasil estará se ajustando adequadamente à crise, e ao sair dela terá condições de liderar o grupo dos BRICs. Mas para isto é preciso que o governo atue com o horizonte de estadista, e não com a visão míope de maximizar os benefícios de curto prazo. Isto requer cortes de gastos públicos, deixando o espaço aberto para os investimentos privados, e não o aumento daqueles gastos através de políticas contra-cíclicas.
O Brasil encontra-se em uma situação privilegiada. De duas formas provamos as virtudes da austeridade fiscal, de uma independência de fato do Banco Central capitaneando o regime de metas de inflação, e do regime de câmbio flutuante. A primeira foi em construir as bases para o forte crescimento com a estabilidade de preços, apesar da gritaria contra as taxas de juros e contra a defunta valorização do real. A segunda está sendo mostrada agora, com a capacidade de superar, melhor do que muitos outros países, os efeitos da atual crise.
São fatores que indicam que podemos sair desta crise com um vigor maior do que os demais países emergentes. Quando comparamos o Brasil com Argentina, e todos os demais populistas da América Latina, saímos em grande vantagem. Certamente não temos os mesmos custos do México, que se atrelou aos Estados Unidos. O desempenho atual brasileiro vem superando o dos países do leste europeu e da própria Rússia, que vem cometendo erros de política econômica, perdendo rapidamente as reservas para tentar evitar uma inevitável depreciação do rublo. Mas para que esta visão se concretize é preciso prosseguir no mesmo caminho, resistindo à tentação das políticas contra-cíclicas.
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