terça-feira, 17 de junho de 2008

Mercado azeda e favorece os vendidos

A piora do mercado nas últimas duas semanas fez com que o exercício de opções (direito de comprar ou vender um ativo a um determinado preço e uma data preestabelecida) ontem na Bovespa fosse, de longe, dos vendidos, ou seja, daqueles que apostavam na baixa e venderam opções de compra, assumindo a obrigação de vender a ação a um determinado preço. Como as ações foram caindo dia após dia, ficaram bem abaixo dos preços das opções vendidas há um mês. Com isso, os contratos não foram exercidos e os vendidos não tiveram de entregar os papéis e ainda ficaram com o prêmio pago no lançamento da opção.

Para se ter idéia do caos que tomou conta do mercado desde o último vencimento de opções, no dia 19 de maio, o Índice Bovespa caiu 7,53%. Nesse período, as ações preferenciais (PN, sem direito a voto) da Petrobras caíram 4,88%. Os grandes volumes de negócios estavam nas séries de compra das PNs de Petrobras entre R$ 50 e R$ 58. No dia 21 de maio, por exemplo, os papéis da estatal atingiram a máxima de R$ 52,51 e as opções de compra até R$ 50 pareciam uma barbada, impossíveis de não darem exercício. Pois é, e não deu. As preferenciais fecharam ontem a R$ 45,80 e todas essas grandes séries simplesmente viraram pó absoluto, ou seja, ficaram fora das condições de serem exercidas. Já o Índice Bovespa fechou ontem em alta de 0,12%, aos 67.284 pontos.

A grande desgraça, no entanto, ficou por conta das opções de Vale. Desde o último vencimento, as preferenciais série A da mineradora caíram 19,84%. As principais séries de opções de compra das ações da mineradora estavam entre R$ 48 e R$ 56 e também pareciam perfeitamente factíveis de serem exercidas, já que as PNAs no dia do último exercício, em 19 de maio, atingiram a máxima de R$ 58,70. Desde então, os papéis vieram ladeira abaixo e ontem fecharam a R$ 46,99, colocando todas as grandes séries de opções na lata do lixo. Apenas as opções de compra a R$ 46 deram exercício e, há um mês, pareciam galinha-morta, pois as ações estavam muito acima desse nível.

Desde o último exercício, que nitidamente foi de vitória dos comprados - quem adquiriu opções de compra e, portanto, tem o direito de comprar um ativo a um determinado preço - o mercado mudou da água para o vinho.

Até meados de maio, as incertezas externas tinham dado uma trégua e o Brasil estava em lua-de-mel com os investidores, depois de ter sido promovido à grau de investimento pela Standard & Poor's e em vias de ganhar a segunda promoção da Fitch Ratings. No entanto, a partir deste mês, o temor de que os bancos internacionais terão perdas importantes com os títulos hipotecários de alto risco voltou a rondar os pregões. Além disso, a inflação mundial tornou-se uma preocupação diária e o mercado começou a cogitar um aumento na taxa de juros americana e uma valorização do dólar ante as principais moedas, o que deflagraria um acentuado processo de desvalorização das commodities, que nos últimos cinco anos estiveram para o alto e avante. Isso acertou em cheio as ações da Petrobras e da Vale, que são os dois papéis mais importantes do Ibovespa e os que concentram o volume de opções.

Desgraça adicional

Além de todos esses tropeços, as ações da Vale sofreram adicionalmente nos últimos dias com a notícia de que a companhia fará um megaumento de capital da ordem de US$ 15 bilhões. O que se espera é que essa operação seja apenas uma das várias formas de a mineradora captar recursos para ter "bala" suficiente para fazer uma grande aquisição no exterior. No fato relevante sobre o aumento de capital, a mineradora não desmentiu nem confirmou. Ela negou que esteja fazendo alguma aquisição, mas afirmou que os recursos advindos da venda de ações serão usados para vários fins, entre eles, para uma possível aquisição estratégica.

Os palpites com relação ao negócio são os mais diversos. Com tanto dinheiro na mesa, já apareceram várias noivas querendo casar com a Vale. Os acionistas da mineradora britânica Anglo American, por exemplo, estariam dispostos a aceitar uma oferta de compra da Vale. Já se fala também que a Glencore, que possui participação de 35% na Xstrata, estaria disposta a retomar a negociação a venda da companhia para a mineradora brasileira.

Entre as opções, faria mais sentido uma aquisição que aumentasse a exposição da Vale no segmento de carvão ou de cobre, acredita o analista da Unibanco Corretora Rogério Zarpao. A Freeport McMoran Copper & Gold, por exemplo, seria um ativo puramente de cobre. Apesar dos fundamentos da companhia brasileira serem bons, no curto prazo, as ações devem continuar sofrendo, enquanto houver incertezas com relação a essa possível aquisição, lembra Zarpao. "Ninguém sabe quem a Vale irá comprar, por quanto, quando, em quais condições e nem se ela fará algum negócio."


Daniele Camba é repórter de Investimentos

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