Por Luciana Monteiro, de São Paulo
O comportamento da bolsa neste ano parece mais uma brincadeira de bem-me-quer, malmequer: em janeiro, o Ibovespa caiu 6,88%, em fevereiro, subiu 6,72% e, em março, perdeu 3,97%. Já o mês de abril foi de valorização, com o índice subindo 11,32% e, em maio, nova alta, de 6,96%. Em junho, no entanto, o principal indicador da bolsa não resistiu às fortes turbulências do mercado e fechou em queda de 10,44%. Com isso, o Índice Bovespa, que era a única aplicação a superar a inflação medida pelo IGP-M no ano até maio, acumula agora, no primeiro semestre, perda real de 4,73%. Em junho, a maior alta foi do ouro, com 1,72%, devido à volta da incerteza com a economia mundial.
Neste mês, o cenário não é dos mais amistosos para a bolsa, apesar de os economistas também não enxergarem um derrocada. Com a inflação preocupando o mundo todo - inclusive o Brasil -, os bancos centrais têm sido obrigados a elevar a taxa de juros. E a combinação de juros maiores e crescimento menor não é nem um pouco benéfica para o investimento em ações. Por aqui, a expectativa é de nova alta da Selic na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que será realizada nos dias 22 e 23.
O que se pode esperar para a bolsa é muita volatilidade nos próximos meses, diz André Segadilha, chefe do Departamento de Análise da Prosper Corretora, lembrando que a bolsa brasileira é muito concentrada em commodities, que têm oscilado muito, levando junto o Índice Bovespa. Para se ter idéia, o Índice CRB, que reflete o comportamento das commodities, está em 29% no acumulado do ano, o maior nível no primeiro semestre em 35 anos. "Enquanto isso, as ações de segunda linha ficaram praticamente esquecidas", diz. Um sinal disso é que, no ano, o Índice Valor de pequenas e médias empresas (IVBX-2) cai 2,59% no ano, enquanto o Ibovespa sobe 1,77%. Por isso, Segadilha recomenda aos clientes permanecerem em ações de maior liquidez no curto prazo.
Segundo ele, há muitas dúvidas no cenário internacional e isso se traduz em volatilidade. "Ainda há indefinições quanto ao comportamento do preço do minério, dos alimentos, do petróleo, sem falar na inflação mundial e nos resultados ainda ruins dos bancos por conta da crise nos Estados Unidos", diz o executivo.
A inflação também tem tirado o sono de muitos investidores. Considerando-se o IGP-M, nenhuma aplicação financeira supera a inflação no ano. Em junho, a alta do indicador foi de 1,98% e, no ano, já chega a 6,82%. E a pressão sobre o IGP-M deve continuar. Ontem, a Associação Nacional das Instituições do Mercado (Andima) divulgou uma projeção de 1,38% para o IGP-M no final de julho e de 0,82% para o mês de agosto.
A volatilidade do IGP-M é explicada pelo peso de 60% dos preços no atacado. A coisa melhora um pouco quando se usa como referencial o IPCA, índice oficial do governo que representa uma cesta de consumo das famílias. O resultado de junho do IPCA só sai depois do dia 10 de julho, mas projeções apontam para uma alta de 0,70% no mês passado e de 3,60% no ano. Mas a pesquisa Focus, feita pelo Banco Central, mostrou ontem também que as projeções do mercado para o IPCA deste ano já se aproximam do teto da meta, de 6,5% de inflação. Por conseqüência, o Focus indica também uma tendência de a Selic encerrar o ano em 14,25%. Hoje, o juro básico está em 12,25% ao ano.
A aposta na inflação foi o grande diferencial para os fundos multimercados que conseguiram ir bem em junho, diz Alexandre Póvoa, diretor da Modal Asset Management. "E, ao que tudo indica, o potencial de surpresas negativas com a inflação é maior que a de positivas", avalia. Para tentar ganhar com a alta de preços, no entanto, o investidor precisa recorrer às Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B), atreladas ao IPCA. Os papéis em IGP-M seriam melhores, por conta de o índice estar com variação muito superior ao do IPCA, diz Póvoa. O problema é que, desde maio de 2006, o Tesouro deixou de emitir papéis indexados ao indicador, as Notas do Tesouro Nacional série C (NTN-C).
Olhando para o quadro atual, de pressão inflacionária no mundo, os bancos centrais terão de agir e, com isso, é muito difícil nesse cenário esperar uma recuperação rápida para a bolsa, avalia Póvoa. "Olhando para o 'paciente' (a bolsa), não dá para ser tão otimista", diz. "Por aqui, o Banco Central pode ter de estender o aperto monetário por mais tempo e o quadro para a bolsa não é tão auspicioso."
A queda do mês passado trouxe algumas oportunidades em bolsa, mas a recuperação não deverá ocorrer na velocidade que o mercado quer, avalia Thiago de Castro, sócio do escritório de aconselhamento financeiro Tag Investimentos. "Vamos ter problemas sérios com o mercado internacional e a crise externa", diz.
O que pode trazer algum benefício para o desempenho da bolsa é o petróleo, que continua subindo. Só os papéis da Petrobras representam 15% do Índice Bovespa e, enquanto o indicador caiu 10,44% em junho em termos nominais, as ações ordinárias (ON, com direito a voto) da estatal perderam apenas 1,66%. Os fundos compostos somente por papéis da Petrobras registravam queda de 4,79% até o dia 25 e, no ano, o ganho ainda era de 5,06%. O resultado dos fundos ainda não leva em conta a alta de 3,22% dos papéis ON nos dias 26, 27 e 30.
Já no caso das carteiras de ações ON da Vale, a perda acumulada em junho é de saltar aos olhos: 10,44% até o dia 25 e, no ano, 1,87%. Esses números devem piorar com a queda de 2,18% entre os dias 26 e 30 do mês passado. "No curto prazo, os papéis podem continuar sofrendo com um possível anúncio de aquisição pela mineradora, mas, no longo prazo, são interessantes", diz Rogerio Betti, sócio do escritório de aconselhamento financeiro Beta Advirsors.
Na renda fixa, o Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI) - referencial para os fundos da categoria - encerrou maio com variação de 0,95% e, no ano, acumula 5,43%. Em termos reais, ao se descontar a inflação medida pelo IGP-M, a queda é de 1,02% no mês passado e, no ano, a perda é de 1,33%. No caso da caderneta de poupança, o retorno nominal em junho foi de 0,62% e, no ano, é de 3,50%. Descontando o IGP-M, entretanto, a perda é de 1,34% no mês e de 3,11% no semestre. A caderneta perde mesmo se o referencial for o IPCA.
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