18/07/2008 15:09:34
Estamos diante de uma inflação planetária que tem pouco a ver com a crise do subprime dos Estados Unidos. Tem tudo a ver com a expansão da economia mundial e o comportamento dos bancos centrais. Por um lado, deram pouca atenção à expansão da liquidez e, por outro, pela absoluta falta de interesse na regulação da atividade financeira. Durante muito tempo, aceitou-se a hipótese de que a última década de “progresso e calmaria” internacional era fruto exclusivo da “credibilidade” dos bancos centrais. É possível, mas hoje sabemos que o “progresso e a calmaria” escondiam graves problemas criados com base na filosofia do laisser-faire.
É preciso insistir. A turbulência do subprime não é a crise do setor real americano. É apenas manifestação da patifaria do inventivo setor financeiro incontrolado, produto da hegemonia ideológica a assegurar que a total liberdade dos mercados continha em si o seu controle moral (hoje há controvérsia). A crise americana virá quando o novo presidente eleito tiver de ajustar o déficit em conta corrente, seguindo o conselho do velho Nicolò: “O mal todo de uma vez... e no início!”
Estamos diante de um momento muito complicado, o que torna difícil organizar o pensamento. De um lado, temos uma desvalorização da unidade de medida dos preços internacionais, o dólar americano. Uma verdadeira inflação em dólares não internalizada nos EUA. Ela pode ser facilmente apreciada pela diferença dos índices de preços internacionais (The Economist Commodity-Price Index) medidos em dólares e em euros. Com base na média de 2000 = 100, o primeiro, no fim de junho, era de 266 e o segundo, 158. O comércio externo dos emergentes é precificado, portanto, em dólares inflacionados em 40%. Suas dívidas, felizmente, continuaram medidas em dólares nominais constantes e, graças às políticas acomodatícias de juro dos bancos centrais, o seu custo também não subiu. É isso que explica, em boa parte, a bonança da situação daqueles países (inclusive a do Brasil).
A dramática ligação entre a variação da relação euro-dólar e os preços do barril de petróleo podem ser apreciados no gráfico. O poder desestabilizador dos preços do petróleo diminuiu entre a última crise (1980) e a atual, em razão de: 1. Técnicas economizadoras de energia (o consumo de energia por unidade de PIB caiu quase 50% nos países desenvolvidos). 2. Valorização das moedas produzidas pelo mecanismo de câmbio flutuante, que absorve parte dos aumentos e impede que eles sejam internalizados integralmente. O aumento dos preços do petróleo está longe de esgotar-se na inflação do dólar. Ele decorre, principalmente, de condições objetivas ligadas à oferta, que utilizou toda a capacidade ociosa por falta de investimentos em pesquisa, exploração e refino. Nos últimos 15 anos, os investimentos não acompanharam o aumento da demanda. Entre o segundo trimestre de 2006 e o de 2008, o consumo mundial (e a oferta) passou de 83,6 milhões para 86,1 milhões de barris por dia, 1,5% ao ano. Na China (9,2% do consumo mundial), foi de 5%.
O segundo fator da inflação planetária é o rápido aumento da demanda de produtos agrícolas e minerais produzido pela grande expansão dos países emergentes (em particular, a China e a Índia), que continuam a se urbanizar e crescer em torno de 6% ao ano, apesar da redução do ímpeto dos países desenvolvidos, que crescem em torno de 1,7%. Como no curto prazo a oferta agrícola e mineral é inelástica, isso produziu uma mudança de preços relativos de energia e alimento que, por sua ubiqüidade, responde muito mal à política monetária. O problema é sério, mas não devemos esquecer que foi em parte criado na última década, pelos bancos centrais que usaram mal a sua necessária autonomia.
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