sexta-feira, 6 de junho de 2008

Preço das matérias-primas deve continuar subindo

Por Angelo Pavini, de São Paulo
Apesar da balançada recente, os preços das commodities agrícolas vão continuar a subir, entre 5% e 10% neste ano e no próximo, o que beneficiará os países produtores de matérias-primas, como o Brasil. A avaliação é de Joyce Chang, diretora gerente e estrategista de Mercados Emergentes do banco americano JP Morgan. O banco tem o Brasil como uma das suas principais recomendações para os investidores internacionais que aplicam em títulos de renda fixa. Uma das mais influentes analistas de mercado de renda fixa internacional, Joyce virá ao Brasil no dia 10, terça-feira, para participar do Seminário Anbid de Finanças Corporativas, promovido pela Associação Nacional dos Bancos de Investimento e Desenvolvimento.

A analista diz que não mudou as projeções para as matérias-primas depois das declarações do presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) Ben Bernanke, reclamando do dólar fraco, o que fez a moeda subir e as commodities caírem. Ela acredita, no entanto, que os metais, inclusive os preciosos, como o ouro e a prata, se tornam mais vulneráveis e podem sofrer no futuro.

Já o petróleo pode cair, mas, mesmo assim, se manterá em um nível elevado em relação à média do ano passado. E isso será bom para os países produtores, avalia a executiva. "O ponto é que muitos países estão contando com um preço do barril em seus orçamentos que é pelo menos US$ 50 abaixo do atual, e por isso, mesmo uma queda acentuada não necessariamente levará essas nações produtoras a ter déficits externos em suas contas correntes", explica.

As commodities em alta continuarão dando suporte aos países emergentes e à demanda por seus ativos, avalia Joyce. A maior preocupação com relação aos mercados emergentes, e aí incluindo o Brasil, é com a inflação subindo em muitos desses países, avalia a executiva.

Outro risco para os emergentes está nas contas externas e nos déficits de contas correntes, resultado do saldo da balança comercial e da conta de capitais, afirma Joyce. Fábio Akira, economista chefe do JP Morgan no Brasil, prevê um déficit de contas correntes brasileiro de 3% do Produto Interno Bruto (PIB, soma das riquezas produzidas pelo país) para 2009. Outro risco é com o nível de apreciação cambial, ou seja, de desvalorização do real e alta do dólar. "Temos o déficit de conta corrente crescendo no próximo ano e isso pode tornar a apreciação cambial uma preocupação", diz Akira.

O economista observa ainda que a projeção de 3% de déficit leva em conta as projeções de alta para as commodities. Se por acaso elas voltarem para os preços de 2005, por exemplo, o país passaria de um superávit de US$ 12 bilhões na balança comercial para um déficit de US$ 10 bilhões, o que elevaria o buraco nas contas correntes e aumentar o risco de alta do dólar. "Não estamos baixistas em relação ao real, mas nós não vemos a moeda nesse contínuo movimento de valorização dos últimos meses, e vemos mais riscos vindo do cenário das commodities."

O JP Morgan vem mantendo recomendação de compra acima da média do mercado (overweight) para os papéis brasileiros há um bom tempo e, por isso, não houve alteração por conta de o país ter conseguido obter o grau de investimento de baixo risco da Standard & Poor's no fim de abril e da Fitch no fim de maio, afirma Joyce. "Mas o segundo selo veio antes do que esperávamos, acreditávamos que seria só no segundo semestre, mas que viria com certeza este ano", afirma Joyce.

O resultado prático da promoção é que os grandes investidores internacionais passam a esperar que o Brasil convirja mais rapidamente para os níveis de países como o México em termos de preços pagos em seus papéis no exterior. "Por isso, estamos recomendando a dívida soberana do Brasil e também algumas empresas brasileiras que já têm mais de um 'investment grade' e que provavelmente vão ser beneficiadas pelo segundo selo", afirma a executiva. Entre as empresas, ela cita Vale, Petrobras, Bradesco, AmBev e Embraer, que fazem parte do índice Lehman Aggregate, referencial para os grandes investidores que exigem baixíssimo risco nas aplicações. "Elas provavelmente terão maior demanda por seus papéis pela comunidade investidora mais exigente", diz.

Já para Akira, com o país convergindo para níveis mais altos de classificação de risco, saindo de "BBB" para "A", por exemplo, os juros reais também deveriam se ajustar a níveis mais decentes. "Se isso é verdade, pequenas e médias empresas também serão beneficiadas pelo 'investment grade' e por um ambiente macroeconômico mais favorável.", diz ele. Assim, no curto prazo, empresas que já têm grau de investimento seriam beneficiadas, mas, no longo prazo, todas ganhariam com crédito mais barato e crescimento econômico.

Além do Brasil, as principais recomendações de Joyce entre os países emergentes em termos de papeís de renda fixa no mercado internacional são produtores de commodities, como Rússia, alguns países da África, Oriente Médio e, na América Latina, Peru, em moeda local. "Mas o Brasil está entre nossas 'top recomendations' na América Latina", diz a executiva.

Para a executiva, não houve um aumento expressivo de investimentos externos no Brasil após o grau de investimento porque um número grande de investidores já havia antecipado o acontecimento. "Já vínhamos acompanhando um aumento das aplicações no Brasil há um bom tempo", diz Joyce. Ela acredita que, com dois selos diferentes, o país terá um novo tipo de investidor entrando no Brasil também, os tradicionais de baixo risco de crédito que não eram autorizados a investir no Brasil.

Sobre o que os países emergentes podem fazer para evitar os riscos do crescente déficit externo, Joyce diz que há preocupações em relação à moeda sobrevalorizada em alguns países, que diminui a competitividade das exportações. "Mas o que os investidores em geral gostam de ver é mais ação em reformas estruturais e no lado fiscal", diz a executiva. No caso específico do Brasil, Akira acredita que seria preciso ainda uma coordenação maior entre a política monetária do Banco Central e a política fiscal do Ministério da Fazenda para conter a alta da inflação. A falta de comunicação entre as duas políticas, diz ele, reduz o impacto das medidas junto ao mercado.

Sobre a proposta de aumentar o superávit primário brasileiro, Joyce diz que os investidores internacionais estavam preocupados com o primeiro anúncio do fundo soberano brasileiro. "Eles ficaram contentes em saber que o governo deve adiar o projeto, dando prioridade para melhorar a performance fiscal", diz ela. "Eu penso que o mercado viu isto como um bom sinal."

Joyce espera que os países emergentes continuem crescendo neste ano e no próximo apesar das pressões inflacionárias. Para o Brasil, Akira trabalha com um crescimento de 4,4% este ano e 4% em 2009, percentuais menores que os 5,4% de 2007. "Os números consideram ainda um robusto crescimento da demanda doméstica e uma redução da contribuição da demanda externa líquida, devido à desaceleração em países do G3", diz o economista.

Entre os emergentes, Akira estima um crescimento médio de 6,2% em 2008 e de 6,3% em 2009, para 7% em 2007. "Mas haverá desempenhos bem diferentes, com países mais vinculados a produtos manufaturados, como Coréia, Taiwan, Tailândia, Filipinas e Malásia, que devem sofrer mais, enquanto outros serão beneficiados pelo ciclo ainda de alta das commodities, especialmente os da América Latina", diz.

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