quarta-feira, 30 de abril de 2008

Por Angelo Pavini, de São Paulo
A alegria dos investidores em ações durou pouco. Depois de chegar perto do recorde histórico na segunda-feira, o Índice Bovespa voltou a cair, perdendo quase metade do ganho do mês em um só dia. Em abril, o retorno está agora em 4,69% e, no ano, há uma perda de 0,10%. Olhando o gráfico de julho do ano passado para cá, porém, o que se vê é que o Ibovespa já repetiu essa rotina de agonia e glória outras vezes. O que chamou a atenção desta vez foi que a recuperação foi sustentada por uma forte entrada de investidores estrangeiros. Neste mês, até dia 24, o saldo na Bovespa estava positivo em R$ 6,172 bilhões, recorde mensal absoluto, zerando as fortes saídas do ano. A pergunta que fica ao observar o ganho do mês e a forte entrada de estrangeiros é: será que o pior já passou?

A maioria dos analistas reconhece que um dos piores receios do mercado, a possibilidade de quebra de um banco de grande porte americano ou europeu, diminuiu bastante com a atuação dos bancos centrais americano e europeus injetando caminhões de dinheiro no mercado. Mas esses mesmos analistas observam que boa parte da recuperação deste ano se refere a papéis ligados a commodities. Olhando os preços médios das matérias-primas pelo Índice CRB, o que se nota é que os preços estão 30% acima dos valores de junho do ano passado.

Isso explica o forte descolamento entre o Ibovespa, que sobe 17,34% no período, e o índice americano Standard & Poor's (S&P), que cai 7,48% de junho para cá. A lista das maiores altas e baixas deste ano também mostra o efeito das commodities, com fortes ganhos das siderúrgicas. Já as baixas misturam papéis menos líquidos com casos específicos, como Cesp, cujo leilão de privatização fracassou, e Gol e TAM por conta do preço do petróleo.

A situação da bolsa melhorou em relação ao início do ano, afirma Roseli Machado, responsável pela Fator Administração de Recursos (FAR). "O problema para o mercado é quando não se sabe o tamanho da crise", diz ela. "Hoje já se sabe que não há nenhum grande banco quebrando e o mercado voltou rapidamente, o S&P e o Ibovespa acompanharam", afirma.

O que deve influenciar o mercado agora, diz, é o reflexo dessa crise bancária sobre a economia global, sobre o consumo dos americanos, e quanto tempo a economia dos EUA vai demorar para se recuperar. "Como o mercado não tem tanta clareza sobre essas variáveis, deve ter dificuldade em superar a barreira dos 66 mil pontos na Bovespa", diz Roseli. Ao mesmo tempo, quando saírem números ruins de atividade nos EUA, o mercado deve piorar e o índice volta para os 60 mil pontos. "Mas é um processo de preparação para uma arrancada do mercado no futuro", diz ela, que trabalha com um Ibovespa em 80 mil pontos no fim deste ano e vê maior potencial de ganhos no setor de siderurgia.

Além da atividade econômica mundial, outro fator de indefinição é a inflação, afirma Roseli. Se a alta for estrutural e, portanto, de longo prazo, deve levar a uma elevação dos juros ao redor do mundo, inclusive nos mercados emergentes, por algum tempo. E juro alto pode afetar os preços das commodities e, portanto, os papéis brasileiros.

A bolsa andou bem este mês e recuperou as perdas do mês passado, mas a pressão da incerteza no mercado externo continua, diz Pedro Galdi, analista de investimentos da corretora do Banco Real. Ele lembra que há dúvidas sobre o que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) poderá fazer para ajudar a recuperação da economia, uma vez que não pode reduzir muito os juros, que já estão abaixo da inflação. "E aí as opiniões começam a se dividir e o mercado fica volátil, com o Ibovespa variando entre os 60 mil pontos e os 66 mil", diz. "Ficamos nessa história de bem-me-quer, mal-me-quer, este mês foi de bem-me-quer." Mas ele destaca que a tendência do índice ainda é de alta e há a expectativa de que o país receba o grau de investimento não-especulativo ("investment grade"), o que vai atrair novos investidores externos para cá. Galdi estima um valor justo para o Índice Bovespa em 81 mil pontos e espera uma melhora no segundo semestre deste ano.

Nos próximos seis, oito meses, o cenário para a bolsa brasileira é ruim, afirma Caio Megale, da Mauá Investimentos. Segundo ele, ajuda nessa visão negativa o fato de o BC brasileiro ainda elevar mais a taxa de juros. "O BC vai subir os juros em até 2,5 pontos percentuais e isso não está no preço das ações hoje", alerta. E se o juro subir e segurar a economia como quer o BC, empresas de varejo devem cair mais.

Outro fator que influenciará a Bovespa será a bolsa americana. Megale está mais pessimista com a economia dos EUA, uma vez que os custos com petróleo estão aumentando, os salários diminuindo e as margens das empresas sendo comprimidas. Isso tudo deve retardar a recuperação da economia nos próximos seis, sete meses. "E, aí, fica difícil a bolsa brasileira subir com a americana caindo". No longo prazo, porém, Megale é comprador de bolsa. "Para um ano, dois, há muito crescimento de lucro que não está embutido nos preços de empresas que estão muito baratas", diz.

Os fundamentos da economia brasileira continuam bons e dão sustentação para a bolsa, acredita Tomás Awad, estrategista da Itaú Corretora. "Podemos ter alguns surpresinhas com inflação mais alta e contas externas, mas no geral o cenário é bom", diz. Ele reconhece que o cenário externo ainda é incerto, mas acha que a economia americana deve se recuperar e, com isso, o Ibovespa teria condições de atingir níveis entre 75 mil e 77 mil pontos. "Nossos preços ainda estão atrativos olhando os indicadores de Preço/Lucro (referencial que estima em anos o tempo de retorno do investimento na ação) em relação a outros países", diz. Segundo ele, o P/L do mercado brasileiro está em 10 vezes, para 13 dos EUA e 15 vezes da China e Índia.

Já Alexandre Póvoa, da Modal Asset Management, é mais pessimista. Para ele, a economia americana não vai se recuperar tão rapidamente, já a partir do último trimestre deste ano, como acreditam os analistas. Nesse cenário, os papéis de primeira linha seriam ameaçados por uma queda nas commodities e as de segunda, pela falta de liquidez. "O Ibovespa em 66 mil pontos é extremamente perigoso para o investidor", diz.

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