segunda-feira, 19 de maio de 2008

Bovespa, tempo bom sujeito a trovoadas

Os investidores compraram cegamente a história de que o Brasil está na antevéspera de ganhar o "investment grade" por outra agência de classificação de risco e tentaram antecipar esse evento na semana passada. Na sexta, o Ibovespa alçou mais um recorde, aos 72.766 pontos, após subir 1,78%. Na conta do mês, a valorização chega a 7,22%. Achar que a confirmação do selo não-especulativo pela Fitch, na seqüência da Standard & Poor's, será uma panacéia que livrará a bolsa brasileira de todo e qualquer contágio internacional pode ser um equívoco, na visão de alguns especialistas. Talvez seja a hora de acalmar os ânimos e evitar comprar no meio do oba-oba.

O coro dos contrários é puxado por Marcelo Ribeiro, da Pentágono Asset Management, para quem o "investment grade" era bola cantada desde a gestão de Armínio Fraga na presidência do Banco Central (BC). "A apreciação cambial, a valorização da bolsa e a queda do risco país indicam que muito já está no preço dos ativos", diz. Para ele, a classificação trará, no longo prazo, maior sustentabilidade para as cotações, mas não nos níveis atuais, esticados e muito distantes das médias históricas - o seu preço justo para o Ibovespa está em 40 mil pontos. Ribeiro argumenta que o capital estrangeiro, que tem alimentado os recentes recordes, não enxerga o país de forma muito diferente do que uma barra de ouro ou um barril de petróleo. "Como as commodities estão na moda, o grau de investimento tem o mesmo efeito que um atentado na Nigéria tem no petróleo."

A alta correlação da bolsa brasileira com as matérias-primas internacionais é um dos grandes riscos. Até aqui, o Brasil foi alavancado pela demanda chinesa, mas na visão de Ribeiro essa situação não vai durar. "A história não endossa a sugestão dos bancos de investimentos para colocar parcela dos recursos em ativos reais e se proteger da inflação", diz. "Secularmente, as commodities apresentam performance inferior ao CPI (a inflação dos EUA) e só o petróleo é que tem um ganho real de 2,5% ao longo do tempo."

Para Dorio Ferman, da Opportunity Asset, é fugaz o raciocínio de que os hedge funds criaram uma bolha nos contratos de petróleo e de commodities em geral. "O mercado futuro é uma conta de soma zero, para cada comprado (que aposta na alta) há um vendido (na baixa) e quando você vê os preços à vista maiores do que os futuros, isso descaracteriza uma bolha", afirma. "O preço à vista tem a ver com a idéia de escassez, é compra para consumo, ninguém está guardando petróleo físico."

Correções à vista?

Pela análise dos sinais, usada pela engenharia espacial para filtrar imagens e pelos sismólogos para prever terremotos, há indícios de correções para o Ibovespa no horizonte. A metodologia, adaptada ao mercado brasileiro pelo pesquisador do Ibmec-SP Marco Antonio Leonel Caetano, em conjunto com o professor Takashi Yoneyama, do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), avalia o grau de estresse das bolsas nos períodos que antecedem crises. Quando as ações ou o índice ficam com preços muito próximos de compra e venda, sem assumir direção e com grandes volumes negociados nas duas pontas, é um termômetro de que o mercado pode ceder espaço a movimentos violentos. É essa a situação configurada no fim da semana passada.

"Se nosso modelo estiver correto vamos ter outra queda abrupta", diz Caetano. "E se for com a mesma intensidade das reversões de agosto/outubro de 2007 ou janeiro de 2008, vamos parar em 58 mil pontos." Para ele, o que pode desencadear o movimento é alguma seqüela da crise das hipotecas ou pressões inflacionárias. Se a confirmação do grau de investimento vier nos próximos dias, o ajuste pode ser adiado, mas virá. Isso não quer dizer que os bons tempos da renda variável local chegaram o ao fim.

Para Caetano, há questões fundamentais em curso que podem mudar radicalmente a cara da bolsa. "Se o campo Carioca (da Petrobras) for declarado como um dos maiores do mundo, o Brasil vai ter uma commodity que todos precisam", diz. Petrobras poderia assim repetir a história da Vale e das siderúrgicas locais, que já tiveram o aumento da demanda embutido nos seus preços.


Adriana Cotias é repórter de Investimentos

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