sábado, 3 de janeiro de 2009

Na toada do Copom

Por Adriana Cotias, de São Paulo

A aparente redução do estresse externo e a sinalização de que o Comitê de Política Monetária (Copom) pode iniciar 2009 com um novo ciclo de cortes da Selic mudaram a percepção de risco da renda fixa. Títulos públicos federais, que haviam registrado prejuízos comparáveis aos da bolsa em outubro, voltaram a recuperar rentabilidade e atrair a atenção dos investidores para o Tesouro Direto. Apesar de os juros implícitos nos prefixados e nos papéis atrelados à inflação já terem recuado de novembro para cá, os analistas ainda identificam bons retornos para o aplicador que quiser fazer a travessia pela crise por águas mais serenas num ano que promete ser rodeado de incertezas no front global.

Depois da quebra do Lehman Brothers, até o relativamente estável mercado de juros brasileiro foi atingido em cheio pelo aumento da aversão ao risco, com a saída maciça do capital estrangeiro dos investimentos em portfólios. As taxas embutidas nos contratos de depósitos Interfinanceiros (DI) e nos títulos públicos negociados no secundário explodiram, abrindo novas e rentáveis frentes de aplicação para os investidores. No fim de outubro, as Letras do Tesouro Nacional (LTN, prefixadas) com vencimento em janeiro de 2010 chegaram a ser negociada com taxa de 17% ao ano, em comparação à Selic atual de 13,75%. Os investidores não se fizeram de rogados e, no mês passado, correram para os prefixados, que lideraram a procura no Tesouro Direto, com uma participação de 45,2%.

Agora, apesar de os títulos federais terem voltado a refletir as expectativas em relação aos próximos passos na política monetária, a leitura é de que as oportunidades para aplicações diretas em renda fixa não se esgotaram. A redução do juro americano para um intervalo entre zero e 0,25% ao ano e as chances de um reinício de afrouxamento no Brasil já neste mês colocam o enorme retorno dos papéis brasileiros em evidência.

"A precificação dos títulos ficou mais palatável, mais com cara de política monetária, pois até então estava embutindo um risco elevado nos vencimentos mais longos, com uma volatilidade que refletia possibilidades de perdas num ativo que, aparentemente, não tinha risco", diz o economista-chefe da Gradual Investimentos, Pedro Paulo da Silveira. A situação melhorou com a queda da Libor (o juro interbancário inglês), mas foi a partir do Copom de dezembro que o mercado começou a colocar nos preços a mudança de postura em relação ao futuro do juro brasileiro. Para ele, a iminência de uma recessão também no Brasil mais do que compensou qualquer temor em relação a possíveis repasses da desvalorização da taxa de câmbio para os preços domésticos, abrindo caminho para que o Banco Central (BC) seja arrojado nas próximas reuniões colegiadas.

Pelo cenário que ele traça, de três cortes de 0,75 ponto percentual para a taxa básica brasileira, para 11,5% ao ano em 2009, há ainda oportunidades para os investidores que quiserem contratar agora um retorno acima disso. A LTN com vencimento em janeiro de 2010 garantia na terça-feira uma rentabilidade de 12,38% ao ano. O papel com resgate em julho pagava 12,40%, em comparação aos 12% estimados pelo mercado para a Selic em dezembro de 2009.

No mercado futuro, as projeções de cortes para a Selic foram amplificadas após a divulgação da ata do Copom. No documento, o colegiado do BC indicou que até o terceiro trimestre a economia brasileira estava acomodada, com o crescimento suportado pelo impulso da renda. Mostrou, entretanto, preocupações com um eventual contágio pelo setor externo, que pode resultar no enfraquecimento da atividade local. Os participantes do Copom ainda colocaram em dúvida se a desvalorização cambial não pressionou a inflação por causa da desaceleração ou porque os estoques ainda estavam elevados.

"Com o quadro recessivo se mostrando mais aparente, maior a propensão de ganhos na renda fixa e dá até para se cogitar quedas mais relevantes ", diz o gestor da Infinity Asset Management Sávio Borba, referindo-se à possibilidade de que as reduções cheguem a 0,5 ponto percentual em cada um dos encontros do Copom até meados do ano. Ele pondera que caso haja sinais de retomada da atividade e o câmbio passe a representar riscos para a inflação corrente esse cenário pode não se realizar. Daí, o investidor tem de estar ciente de que estará correndo risco puro de taxa de juros. Não que haja qualquer chance de perder o dinheiro aplicado num papel prefixado, mas o aplicador fica sujeito às oscilações das taxas no secundário se precisar do dinheiro antes do vencimento. Se deixar o capital até o resgate, vai embolsar exatamente o retorno que contratou.

A crise potencializou a procura pelos títulos públicos e também evidenciou o amadurecimento dos aplicadores. A pessoa física agiu como um investidor institucional vendo no salto dos prêmios uma porta de entrada. Acertar em cheio o melhor momento para comprar um prefixado ou um papel indexado não é tarefa trivial nem mesmo para os profissionais mais tarimbados. "O investidor, se está pensando no futuro, na formação de uma reserva para a aposentadoria, tem de estar ciente de que vai aplicar o dinheiro em algo melhor do que a inflação, não tem de ficar na 'neura' de mercado, se angustiando porque perdeu a taxa mais alta", diz o consultor de Investimentos da Coinvalores, Antenor Ramos Leão.

Para ele, são as Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B), indexadas ao IPCA, a aposta mais certeira, pois o investidor já sabe quanto vai ganhar acima da inflação no ato da aquisição do título. O prazo indicado é a partir de dois anos, assim o aplicador já se beneficia da alíquota menor de imposto de renda, que pela tabela regressiva começa em 22,5% e vai até 15% para investimentos acima de 720 dias.

O incoveniente dos títulos atrelados a preços é que é difícil compreender as oscilações provocadas pela marcação a mercado. "Os papéis sofrem influência tanto das expectativas em relação aos juros quanto da inflação", lembra o superintendente de Investimentos do Banco Real, Eduardo Jurcevic. No pós-Copom, ele considera os prefixados como uma alternativa promissora, desde que o investidor deixe o dinheiro aplicado até o vencimento para não ser pego no contrapé num eventual momento de estresse.

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