quinta-feira, 31 de julho de 2008

Estrelas ofuscadas

Por Angelo Pavini, de São Paulo
Estrelas do mercado brasileiro, respondendo por 30% do Índice Bovespa, as ações da Petrobras e da Vale tiveram seu brilho ofuscado nos últimos dois meses, puxando a queda da bolsa. O papel preferencial (PN, sem voto) da Petrobras acumula queda de 29,35% de 20 de maio - pico do Ibovespa - para cá, enquanto a PNA da Vale perde 29,98%. No período, o índice cai 18,39%. Em 2008, enquanto o Ibovespa cai 6,09%, o papel da Petrobras perde 16,90% e o da Vale, 17,30%.

A perda preocupa principalmente os investidores de varejo, que têm nesses papéis grande parte de sua aplicação em bolsa. Só neste ano, os fundos dedicados a Petrobras captaram R$ 2,209 bilhões e os de Vale, R$ 589 milhões, até dia 28, segundo o site Fortuna.

O desânimo aumenta quando se olha para os fundamentos e para as estimativas das corretoras para os papéis. Segundo dados da Thomson One Analytics, para a Vale, o preço justo médio está em R$ 75,00, ou 80,24% acima dos R$ 41,61 do fechamento de ontem. Para a Petrobras, a média das projeções está em R$ 61,05, 67,3% acima dos R$ 36,50 de ontem. Todas as corretoras, com exceção de uma que recomenda manter para a Vale, indicam compra para os papéis.

Por que então os papéis não sobem? A explicação está em fatores conjunturais de mercado e outros particulares das duas empresas, explicam analistas. O primeiro é a piora do cenário internacional, que fez os estrangeiros venderem pesadamente ações em mercados mais líquidos, como Brasil, e isso atingiu diretamente as ações mais negociadas, no caso Petrobras e Vale. Neste ano, até dia 28, o saldo de estrangeiros na Bovespa está negativo em R$ 14,360 bilhões.

No caso da Petrobras, a queda recente tem a ver também com o recuo dos preços do petróleo, que chegou a US$ 147 o barril e ontem fechou a US$ 127. Além disso, há uma questão regulatória, que é a possibilidade de o governo criar uma empresa para explorar os campos encontrados na região do pré-sal. Os papéis da estatal subiram no ano passado quando as primeiras estimativas do pré-sal surgiram, com o anúncio dos campos de Tupi e Júpiter. Agora, o mercado teme que, com a nova estatal, a Petrobras apenas passe a prestar serviços de exploração, ficando de fora do grosso dos ganhos, que iriam para o governo. "O fato de o petróleo ter recuado e de não se saber se vão criar uma empresa ou aumentar as alíquotas de royalties vêm prejudicando os preços", diz Andres Kikuchi, da Link Investimentos. Ele acredita que essa definição só deve sair no ano que vem, e, até lá, será um fator de volatilidade.

Kikuchi observa, porém, que os preços atuais estão muito baixos mesmo considerando que a Petrobras ficará de fora das novas descobertas do pré-sal. "Os campos de Tupi e Júpiter já estão garantidos e, mesmo assim, a ação está mais barata do que antes do anúncio e de quando o petróleo estava a US$ 100 o barril", diz ele.

O preço atual da Petrobras é bastante atraente, afirma Felipe Cunha, chefe de análise da Brascan Corretora. "Já tivemos Tupi, dois graus de investimentos para o país e o petróleo subindo quase 30%, mas o preço ainda está nos níveis de outubro", observa. Cunha também não vê motivos para o petróleo cair muito mais, uma vez que a produção nova vem de regiões cada vez mais difíceis de explorar, como o pré-sal, o dólar continua fraco no mercado internacional e há problemas em regiões produtoras, como na Nigéria. Ele reconhece que há a incerteza com os novos campos, a defasagem no preço da gasolina e do diesel no mercado interno, na casa dos 15%, mas ainda assim a queda é excessiva. O preço alvo da Brascan para Petrobras é de R$ 65,10. "Há ainda um potencial de crescimento da produção de 5% ao ano até 2012, que poucas concorrentes têm."

No caso da Vale, além do cenário macroeconômico, de desaceleração da China por conta da inflação provocada pela alta das commodities, houve também a queda dos preços do níquel, observa Rodrigo Ferraz, da Brascan. Depois da aquisição da canadense Inco, o produto, que passou a influir no resultado da Vale. E caiu mais de 60% de maio de 2007 para cá, de US$ 51.600 a tonelada para US$ 19 mil, com expectativa de novas quedas. Isso trouxe um componente de volatilidade que a Vale não tinha, uma vez que seu principal produto, o minério de ferro, não é negociado em bolsa e está, assim, fora do risco de especulação de fundos.

Para complicar, a Vale anunciou em junho uma oferta pública de ações de US$ 15 bilhões, que foi vista pelo mercado como um sinal de que a empresa iria se endividar comprando uma empresa em um momento em que o mercado estaria piorando. A companhia explicou que a oferta seria para pagar os investimentos de US$ 59 bilhões em quatro anos. "Mas o mercado ainda desconfia de uma compra", diz Ferraz, lembrando que a operação pode trazer novos produtos negociados em bolsa para a Vale, aumentando sua volatilidade. Porém, ele observa que a demanda por minério de ferro continua forte e a expectativa é de que os preços continuem subindo até 2011.

E novas compras, no longo prazo, seriam interessantes para a Vale. Na lista estão Xstrata, Freeport, Teck-Cominco e Alcoa. Ferraz trabalha com um preço justo para Vale de R$ 74,09, ou 78% sobre o fechamento de ontem. Mas observa que, se os fundamentos costumam prevalecer no longo prazo, no curto a volatilidade deve continuar.

Alguma melhora pode vir com a divulgação dos resultados das empresas nas próximas semanas, diz Eduardo Roche, gerente de Análise da Modal Asset Management. A Vale deve anunciar seu resultado do segundo trimestre no dia 6, e o número virá melhor por conta do aumento do minério de ferro, de 71%. "Mas a dúvida sobre o que ela vai fazer com o dinheiro da captação vai continuar", diz ele, lembrando que não se sabe o tamanho da empresa que ela poderia estar pensando em comprar. O resultado das grandes siderúrgicas, como a americana US Steel e a européia Arcelor Mittral confirmaram que o consumo de aço segue elevado e isso beneficia a Vale. "Mas as variáveis externas continuam incertas", alerta.

Na Itaú Corretora, o preço justo para a Petrobras é de R$ 61,00, sem contar com as áreas novas do pré-sal e com um preço do barril do petróleo em US$ 75, diz Fabio Anderaos de Araujo, estrategista de pessoa física. O papel é uma das principais recomendações da corretora. Para ele, a queda de Petrobras foi acentuada pela saída dos estrangeiros, muitos que haviam entrado depois do anúncio de Tupi. "A isso se junta o atraso na produção e a queda do petróleo, e o papel foi ladeira abaixo", diz. Para Araújo, a análise de Petrobras está "muito pobre", concentrada no preço do petróleo. "Mas se o preço do barril se estabilizar, as bolsas voltam a reagir e o fluxo de estrangeiros deve voltar para Petrobras, que ficou barata demais", diz.

Já Rogerio Betti, da Beta Advisors, acredita que tanto Petrobras quanto Vale estão baratas. O escritório de aconselhamento financeiro considera que os fatores de queda da Vale - receio de menor atividade na China e compra de outra empresa - estão superavaliados. O resultado do segundo trimestre será muito bom e mesmo a compra de outra empresa será positiva, uma vez que os preços das companhias caíram bastante nos últimos três meses. "Xstrata, por exemplo, caiu US$ 30 bilhões", diz.

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