sábado, 6 de dezembro de 2008

Câmbio e Petrobras

Delfim Netto

A operação de crédito que a Petrobras fez com a Caixa Econômica Federal para pagar impostos só teve repercussão negativa porque o governo e a própria empresa custaram muito a explicar uma coisa bastante simples, mas desagradável de reconhecer: houve um desentrosamento entre Ministério, a Secretaria da Receita e os altos escalões da Petrobras que não perceberam que poderiam ter evitado (com uma simples conversa) a concentração do recolhimento de uma pesada parcela do imposto sobre lucros praticamente num único dia.

Faltou realmente uma troca de informações entre os administradores depois da desvalorização da taxa cambial nas últimas semanas. Esta circunstância foi lembrada durante o Jornal Gente da Band, do qual participei com os jornalistas Joelmir Betting e José Paulo de Andrade e pelo senador Francisco Dornelles na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, também esta semana. Ele foi Secretário da Receita Federal e Ministro da Fazenda e quando se discutia na Comissão o problema de caixa da Petrobras, Dornelles sugeriu que o governo estude uma norma para garantir tratamento diferenciado para a cobrança do imposto incidente sobre a valorização dos ativos decorrente de uma desvalorização cambial, permitindo que os tributos sejam pagos num prazo maior.

No passado, quando se fazia uma desvalorização cambial, havia o cuidado de diferir o recolhimento dos impostos sobre lucros (ou os créditos, no caso de prejuízo) para evitar que a concentração produzisse os problemas de caixa que aconteceram agora na Petrobras e a obrigaram a buscar empréstimos. Lembrou o senador Dornelles que nas desvalorizações cambiais de 1980 e 1983, o governo permitiu que o imposto fosse pago com prazos maiores. E os prejuízos das empresas, resultantes da alteração cambial, tiveram prazo maior para se compensarem do imposto.

Naquela ocasião o câmbio era fixo e não restavam dúvidas sobre o quantum da desvalorização, 15% ou 30% conforme o caso. Hoje, com o câmbio flutuante, a depreciação cambial funcionou como se tivesse sido decretada uma desvalorização do Real de 35% a 40%. A Secretaria da Receita Federal, o Ministério e a própria empresa deveriam ter encontrado um mecanismo para tempestivamente diferir o recolhimento do Imposto de Renda sobre o lucro nominal produzido por essa desvalorização. Como não houve esta providência a Petrobras se viu sem recursos de caixa para honrar de uma só vez o pagamento do imposto, uma enormidade como se viu e de uma só vez.

A repercussão em cima da Petrobras revela, contudo, um desentendimento e profunda incompreensão. Como as demais empresas, ela está sendo obrigada a lidar com dificuldades novas derivadas da quebra da confiança que domina os sistemas financeiros e paralisou os mercados de crédito no exterior. Era natural, então, que a Petrobras tivesse procurado o mercado financeiro local para recolher os impostos.

Professor Emérito da FEA/USP. Ex-ministro da Fazenda, da Agricultura e do Planejamento

Nenhum comentário:

Minha lista de blogs